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Vanguarda Operária

maio de 2008 

Histórica ação exige retirada das tropas do Iraque e Afeganistão

Greve contra a guerra paralisa portos nos EUA

080501 ILWU port shutdown, Oakland, Internationalist photo
O porto de Oakland, Califórnia, paralisado no 1° de maio, com os braços dos guindastes em posição
de repouso.
(Foto: The Internationalist)

O seguinte artigo foi traduzido de The Internationalist n° 27, (maio-junho de 2008).

“Nós fizemos, paralisamos a costa”, diziam oradores sindicais na entusiasta concentração ao iniciar o ato praça Justin Herman em San Francisco, Califórnia depois de uma passeata pelo cais do porto, a partir da sede do Local (Seção) 10 do International Longshore e Warehouse Union (ILWU – Sindicato de Estivadores e Armazenistas da Costa do Pacífico dos Estados Unidos). Cada um dos 29 portos da Costa Oeste foi fechado no 1º de maio como resultado da ação das bases do ILWU para exigir que cesse a guerra e ocupação no Iraque e Afeganistão, assim como a retirada imediata das tropas estadunidenses do Oriente Médio. O estivador Jack Heyman, membro do comitê executivo do Local 10, recordou a um locutor de rádio local que costumava dizer: “se as notícias não te agradam, então faça as suas.” “Hoje não só fizemos notícia, fizemos história”, disse Heyman para a multidão de trabalhadores portuários e seus partidários. E é certo. No quinto aniversário do malogrado discurso de George Bush sobre a “missão cumprida” [pela suposta vitória no Iraque], os trabalhadores usaram seu poder industrial contra a guerra.

A histórica ação do Primeiro de Maio realizada pelo ILWU representa a primeira greve de um sindicato estadunidense contra uma guerra dos EUA. Em todos os cais os enormes guindastes de carga e descarga de contêineres mantiveram-se imobilisados, com seus braços em posição vertical, como se fizessem continência à vitoriosa ação dos trabalhadores portuários. Esta ação é uma poderosa demonstração de força que a classe dominante não pode ignorar nem despresar. As bases do sindicato desafiaram as ordens de um juiz trabalhista, que em duas ocasiões lhes ordenaram irem trabalhar. Também venceram as capitulações da direção de seu sindicato, que desde o princípio não queria que se levasse a cabo uma paralisação dos trabalhadores e que logo tentou dissolver e boicotar ante as ameaças legais enquanto lançava seus discursos patrióticos. Os patrões da Pacific Maritime Association (PMA) declararam que o fechamento dos portos em 1º de maio representou uma “greve ilegal”. Não obstante, apesar de todas as travas e dificuldades que apresentaram os porta-vozes da patronal, os trabalhadores portuários mostraram a via para derrotar a guerra imperialista mediante a mobilização do poder da classe operária.

Afinal de contas, foi mais que uma paralisação de trabalhadores. A greve no Primeiro de Maio contra a guerra representa um passo inicial, uma mostra do que falta para derrubar os guerreiristas de Washington. Sua ação “simbólica” se fez sentir até no Iraque, onde os estivadores de dois portos pararam em solidariedade com o ILWU. Uma mensagem para o Primeiro de Maio do Sindicato Geral dos Trabalhadores Portuários do Iraque dirigido aos “companheiros e companheiras do ILWU”, dizia:

“A valente decisão que tomaram para realizar uma greve no Primeiro de Maio para protestar contra a guerra e ocupação no Iraque, faz avançar nossa luta contra a ocupação para assegurar um melhor futuro para nós, o mesmo que para o resto do mundo…. Do Iraque, lhes manifestamos nossa admiração e apoio, até a vitória sobre a barbárie do governo estadunidense.”

O fato que os trabalhadores iraquianos e estadunidenses unam esforços em uma ação comum é uma poderosa mostra do que pode vir. Não se trata de palavras vazias no papel. Os trabalhadores portuários do Iraque e Estados Unidos estão mostrando ao mundo: assim se vê a solidariedade proletária internacional. Tendo sido mostrado, agora falta generalizá-la e aprofundá-la.

Cabe destacar que a ação dos trabalhadores portuários no Primeiro de Maio não se restringiu a estreitas questões relativas à categoria. O atrativo cartaz que anunciava a ação sindical, produzido por um coletivo gráfico pelo Comitê dos Trabalhadores Portuários para Organizar o Primeiro de Maio, ligou a luta para “Defender os direitos dos trabalhadores!” e para “Defender os direitos dos imigrantes!” No ato do ILWU na praça Justin Herman, os oradores convocaram os manifestantes a participarem nas mobilizações a favor dos direitos dos imigrantes que se levaria a cabo mais tarde nesse mesmo dia, tanto que porta-vozes do sindicato falaram durante os comícios dos imigrantes. O impacto da paralisação dos portos tampouco se restringiu a Costa Oeste. Os trabalhadores dos correios de São Francisco, Nova Iorque e Greensboro, em Carolina do Norte, realizaram minutos de silêncio em solidariedade à ação dos portuários. As federações estatais da AFL-CIO [a principal central sindical nos EUA] de Vermont e Carolina do Sul aprovaram moções de solidariedade, instando seus filiados a que empreenderam ações contra a guerra no Primeiro de Maio. O sindi-cato dos professores e trabalhadores administra-tivos da Universidade da Cidade de Nova Yorque (CUNY) convocou eventos em solidariedade à ação do ILWU em onze facultades da CUNY, a maior universidade pública urbana dos Estados Unidos.

A convocatória do ILWU não se limitou aos Estados Unidos. O sindicato recebeu mensagens de apoio de todo o planeta: do sindicato ferroviário Doro-Chiba no Japão; dos trabalhadores portuários da Austrália; da Federação Internacional dos Trabalhadores de Trans-porte; dos conselhos sindicais de Liverpool e Brent, UNITE e da Red Nacional de Delegados Sindicais na Inglaterra; das centrais sindicais brasileiras Conlutas e Intersindical, assim como o SEPE, o sindicato do magistério do estado do Rio de Janeiro, entre outros. No Primeiro de Maio em Roma, Itália, um grupo de ativistas estadunidenses contra a guerra distribuiu filipetas com a mensagem “We Ì ILWU”. E sobretudo, houve as mensagens e a corajosa paralisação dos trabalhadores portuários do Iraque.

O Internationalist Group e a Liga pela IV Internacional tem lutado durante anos para que os trabalhadores de transporte boicotem carregamentos de guerra e por greves operárias contra a guerra. Animamos e logo publicamos a decisão do ILWU de implementar a paralisação tão logo anunciada, para que não fosse enterrado pela inércia dos burocratas ou por sua aberta sabotagem. A atitude dos trabalhadores portuários da Costa Oeste tem demonstrado de maneira contundente que as ações operárias contra a guerra são possíveis e estamos orgulhosos de haver contribuído a se tornar realidade esta perspectiva. Os trabalhadores portuários da Costa Oeste decidiram “parar o trabalho para deter a guerra”. Agora os sindicatos em todo o mundo devem mobilizar-se para seguir o exemplo do ILWU na luta para mobilizar o poder do proletariado para derrotar a guerra dos patrões.

Isto exige não só ação industrial, como também uma ofensiva política contra os partidos Democrata e Republicano, os partidos gêmeos do imperialismo estadunidense. As “alternativas” burguesas e pequeno burguesas como o Partido Verde e o Partido Paz e Liberdade que tem aparecido na exuberante flora e fauna políticas da Califórnia, só servem para forçar a oposição aos limites da política eleitoral burguesa. Um partido operário revolucionário mobilizaria a classe operária, com plena independência a respeito de todos os partidos capitalistas, e contra eles, propondo ações classistas tais como a paralisação dos portos contra a guerra realizada pelo ILWU e dirigindo-as até à luta pela tomada do poder pelos operários. Contra a retórica patriótica de que a “paz é patriótica”, tal partido lutaria pela revolução socialista internacional.

Primeiro de Maio: “Sem paz, não há trabalho”

080501 ILWU support march, S.F., Internationalist photo
O Primeiro de Maio, o dia internacional dos trabalhadores, não é celebrado nos EUA, mas em 2008
os trabalhadores portuários da Costa Oeste festejaram um “dia feriado sem paz, não há trabalho”.
Aqui a marcha do sindicato ILWU em San Francisco marca a ação histórica.
(Foto: The Internationalist)

A decisão de realizar uma paralisação contra a guerra em 1º de maio com a palavra de ordem de “Sem paz, não há trabalho” foi tomada em 8 de fevereiro, na última sessão da assembléia dos trabalhadores portuários de toda a costa, que é o mais alto posto deliberativo dos estivadores, composto por delegados eleitos pelas bases. A proposta a favor da ação sindical contra a guerra, escrita por Heyman do Local 10, foi aprovada por uma ampla maioria de 97 votos contra 3.A chave para a obtenção desta arrasadora votação foi o apoio dos veteranos da guerra do Vietnã, alguns dos quais são politicamente conservadores, que disseram que a guerra deve ser detida a todo custo. Expressaram muita raiva contra os democratas, que ganharam o controle das duas câmaras do Congresso estadunidense nas eleições de novembro de 2006 por uma forte votação contra a guerra. Porém uma vez que tomaram as rédeas, os democratas seguiram aprovando orçamentos de bilhões de dólares para as guerras do Pentágono.

Ao aproximar-se o Primeiro de Maio, os patrões ameaçaram com ações judiciais para intimidar os trabalhadores portuários. No final de março conseguiram que um juiz trabalhista sentenciasse que a ação não poderia fazer-se sob o rótulo de uma reunião mensal regular de “trabalho parado”, com a qual segundo o contrato se pode interromper o trabalho. Em 8 de abril, a direção do sindicato retirou sua petição pedindo que os patrões dessem permissão para tal reunião, porém os planos para realizar a paralisação se manti-veram. Os patrões da PMA solicitaram uma ordem judicial contra os trabalhadores, mas um juiz se recusou a outorgá-la. Nas vés-peras da ação, os patrões marítimos ten-taram novamente: “Um dia antes, um juiz trabalhista se pronun-ciou a favor dos operadores dos termi-nais no cais e de outros patrões que suspei-tavam que uma movi-mentação dos trabalha-dores estava em curso. Ajuizou que parar os trabalhos representaria uma violação ao contrato. O ILWU não fugiu do seu propósito”, como escreveu o San Francisco Chronicle (2 de maio).

No dia anterior, Steve Getzug, portavoz dos patrões marítimos da Costa Oeste, declarou: “Prevemos que o 1º de maio será um dia de trabalho normal”. A antecipação dos patrões resultou equivocada. “A ordem [de não faltar ao trabalho] foi, no entanto, aparentemente ignorada pelas bases do sindicato”, segundo assinalou o Long Beach Press-Telegram. Ao longo de toda a costa do Pacífico, os trabalhadores não se apresentaram ao trabalho. “O porto de San Diego fechou em virtude dos estivadores terem realizado uma greve de um dia para protestar contra a guerra no Iraque”, segundo um despacho da agência Reuters. “Apesar da ordem de um juiz trabalhista determinando que os trabalhadores portuários não deveriam faltar ao trabalho para participar dos protestos do Primeiro de Maio, no porto de Seattle os acessos estavam fechados e havia poucos caminhões”, segundo uma reportagem da KIRO-TV. O canal Fox [cadeia de televisão conservadora] transmitiu imagens de portos parados desde Tacoma até Los Angeles. Em um artigo entitulado “Os trabalhadores portuários se ausentam no Primeiro de Maio, parando todos os portos da Costa Oeste”, Los Angeles Times citava um professor que dizia: “Este sindicato se considera a vanguarda da classe operária na Costa Oeste”.

Os meios de comunicação informaram que a paralisação dos trabalhos do turno da manhã por parte dos 25 mil trabalhadores do ILWU tomou força em todos os portos. Cerca de 6 mil estivadores poderiam operar mais de 10 mil contêineres por dia. “Como não se está trabalhando, isso significa que nenhuma carga está embarcando nem desembarcando”, se lamentou Getzug em nome dos patrões. Durante o locaute patronal da PMA de 2002, se estimou que a perda econômica em todo o país foi de um bilhão de dólares diários. Nos portos de Los Angeles e Long Beach, “o ponto comercial dos Estados Unidos até a Ásia”, que recebe cerca de 40 por cento das importações feitas pelos EUA., o Long Beach Press Telegram (2 de maio) informou que as “operações na maior parte dos centros de transporte marítimo estiveram paralisadas a maior parte do dia”. Um porta-voz da empresa Southern California Maritime Exchange disse que se esperava que chegassem 18 navios cargueiros no 1º de maio, enquanto outros 12 já estavam atracados. Manter um navio cargueiro atracado em um porto sem descarregá-lo custa ao redor de 100 mil dólares diários.

Na Área da Baía de São Francisco, a totalidade dos 34 guindastes do porto de Oakland estavam parados, a maior parte deles com seus braços no alto. As autoridades portuárias tentaram minimizar o impacto, dizendo que só havia um navio cargueiro no porto, porém nós pudemos ver pelo menos quatro atracados no cais e da Ponte da Baía se podia ver outros no porto. A empresa Stevedoring Services of America (SSA) tentou montar um turno reduzido, com o óbvio propósito de demonstrar que a paralisação não lhes havia afetado. No entanto, companheiros do ILWU fizeram piquetes ao amanhecer nos terminais, impedindo a operação fura-greve.

A organização Ação Direta contra a Guerra da Área da Baía estabeleceu piquetes com cerca de 60 militantes nas duas entradas ferroviárias de Santa Fe-Burlington Northern. Em uma entrada, mais de vinte sindicalistas do transporte (UTU Local 239) não entraram para não cruzar o piquete: alguns decidiram chegar tarde ao trabalho e outros simplesmente foram para casa. Na outra, os caminhoneiros se colocaram ao lado da estrada e muitos se recusaram a cruzar a linha. A maior parte deles são operadores-”proprietários” de origem latino-americano que ganham apenas 80 dólares por contêiner transportado, o que não paga sequer o combustível. A maioria desses transportadores deu apoio aos piqueteiros. Um chofer sindicalizado dos Teamsters disse ao The Internationalist: “Que tenham êxito realmente no que estão fazendo. Alguém deve parar a guerra.” Recordou também a luta dos trabalhadores de limpeza do Century City em Los Angeles, há uma década e meia, que finalmente conseguiu o reconhecimento de seu sindicato.

Na sede do Local 10 do outro lado da baía, em São Francisco, os sindicalistas se reuniam para passeata ao longo do Embarcadero. A participação superou toda expectativa. O contingente do ILWU incluía muitos trabalhadores que nunca antes haviam participado em uma manifestação. Quando cerca de duzentos sindicalistas sairam da porta da sede do sindicato, já havia cerca de mil pessoas esperando-lhes na rua. A manifestação foi encabeçada pelo pelotão uniformizado do Local 10, que realizou suas manobras de precisão. Uma banda tocou “Solidariedade para sempre” (um famoso hino operário estadunidense adotado pelos anarcosindicalistas da IWW em princípios do século XX e logo retomado por outras centrais sindicais). Haviam faixas da Associação dos Docentes de Oakland (sindicato do magistério), do Local 1741 do UTU (sindicato dos transportes) e de outros sindicatos. Participaram grupos anarquistas, sindicalistas e socialistas. Havia também estudantes que faltaram as aulas na Universidade Estadual de San Francisco. A mobilização teve um inconfundível tom de São Francisco: diante da bandeira do ILWU no Primeiro de Maio, participou da passeata um grupo de bailarinas sindicalizadas (do Local 790 do SEIU) do clube de striptease Lusty Lady de North Beach, com cartazes que diziam: “As bailarinas exóticas em solidariedade com o ILWU”.

O comício ocorreu na praça Justin Herman, próximo do local onde dois estivadores foram assassinados pela polícia conhecido como a “quinta-feira sangrenta” de 5 de julho de 1934, o que detonou a greve geral em São Francisco. A multidão se animou consideravelmente quando o ator Danny Glover leu parte de um discurso de Martin Luther King contra a Guerra do Vietnã em que se pronunciava a favor de uma “revolução radical dos valores” e de uma restruturação da economia estadunidense. Houve também, uma saudação de solidariedade à ação do ILSU por parte de Mumia Abu-Jamal, que está há mais de um quarto de século no corredor da morte na Pensilvânia (ver quadro). Jamal citou as palavras de outro prisioneiro da guerra de classes, o dirigente socialista Eugen V. Debs: “É a classe dominante a que declara a guerra, mas é a classe subjugada a que trava as batalhas”.

Luta de classes contra a frente popular

O cartaz pela greve contra a guerra. “Parar a guerra no Iraque e no Afeghanistão! Defender os direitos dos trabalhadores! Defender os direitos dos imigrantes! Paremos todos os portos da Costa Oeste!”

Se a ação do sindicato e a passeata demonstraram o poder do movimento operário de São Francisco, o comício mostrou sua debilidade. Ainda que o desencanto com o Partido Democrata tenha colaborado a favor da paralisação do trabalho contra a guerra, os sindicatos seguem acorrentados aos partidos capitalistas, especialmente por meio da burocracia sindical. Entre os oradores esteve a ex congressista do Partido Democrata Cynthia McKinney, que agora busca sua indicação pelo Partido Verde a presidência. Ao mesmo tempo que louvou aos trabalhadores portuários por “traçar uma linha na areia”, apelava a seus “ex colegas” do Congresso para que ponham fim a “guerra de Bush e Pelosi”. Falou Cindy Sheehan, a ativista contra a guerra cujo filho foi morto no Iraque e que agora é candidata independente ao Congresso de São Francisco, contra a porta-voz democrata da Câmara de Representantes, Nancy Pelosi. Falou também uma assistente da congressista democrata Barbara Lee, aclamada por haver emitido o único voto contra a declaração de guerra contra Afeganistão (ainda que duas semanas depois tenha votado a favor do orçamento de guerra).

Vários oradores sindicais fizeram chamados do tipo “manteiga, não canhões”, vinculando os cortes no gasto social e na educação com a guerra. No entanto, uma verdadeira luta contra a guerra no Iraque e Afeganistão não tem que ver com os cortes no orçamento. Se trata de tortura e terrorismo de estado estadunidense, da ocupação colonial e o domínio imperialista que exerce os Estados Unidos no mundo. A luta contra os ataques a educação e outros serviços sociais ou a exigência de serviços médicos para todos são certamente necessárias, como parte de uma luta de classes mais ampla. Entrentanto, apresentar oposição a guerra como se tratasse de se estabelecer outras prioridades, significa que os oradores unicamente querem trocar a política do governo ou quando muito, “reformar” a economia. No fundo, é pedir aos democratas que se oponham a Bush, o que é na verdade o propósito do frentepopulista movimento antiguerra. Tomados no conjunto com os chamados a favor de “apoiar as tropas trazendo-as sãs e salvas para casa” equivale a jurar lealdade aos imperialistas, quando o que faz falta é uma ampliada luta de classes para derrotar a guerra imperialista e derrubar o sistema capitalista que produz uma guerra atrás da outra.

O chamado “social patriota” foi explícito em uma carta do presidente do ILWU, Bob McEllrath, que foi lido ao público, em que dizia que “os estivadores se ausentam do trabalho, porém se colocam a favor dos Estados Unidos. Apoiamos os soldados e dizemos aos políticos em Washington que já é hora de terminar a guerra no Iraque”. Dizia também que as “grandes empresas estrangeiras que controlam o transporte marítimo global não são leais nem prestam contas a nenhum país”. Adiante acrescentou: “Porém nós estivadores somos diferentes. Somos leais aos Estados Unidos e não esperaremos enquanto nosso país, nossos soldados e nossa economia sejam devastados por uma guerra na qual já perdemos 3 bilhões de dólares”. Esta tem sido a tônica dos burocratas do ILWU desde o início: se envolveram na bandeira estadunidense para fazer com que a paralisação portuária resulte o mais inofensivo possível para os governantes estadunidenses. Isto só serve para minar o impacto da ação dos trabalhadores portuários e é precisamente por isso que os burocratas sindicais fazem tais chamados: por descaracterizar e desmobilizar a greve que nunca quiseram realizar.

O presidente do Local 34 do ILWU, Richard Cavalli, disse a multidão que “esta guerra não vai terminar pelos políticos que elegemos em novembro há dois anos, que tem fracassado de maneira escandalosa”. É certo que os democratas não vão por fim a guerra, pois agora representam o principal partido de guerra em Washington, pois canalizam milhões ao Pentágono. No entanto, é completamente falso que tenham “fracassado”. O que estão fazendo é cumprir com seu dever de classe como representante do imperialismo estadunidense. Único entre os oradores foi Jack Heyman, do Local 10, que chamou pela construção de “um partido operário, um partido dos trabalhadores que lute pelos interesses dos trabalhadores”. Não é casualidade que ele tenha sido o autor da proposta a favor da paralisação, sendo que ele também fez o chamado, faz nove anos, para que o ILWU fechasse os portos da Costa Oeste em exigência da liberdade de Mumia Abu-Jamal. Heyman disse na tribuna e mais tarde numa entrevista de rádio que “o que esta ação representa é o passo da luta do nível de protesto ao da resistência”. Esta descrição é bastante adequada e também coloca a meta que agora se enfrenta: passar da resistência a luta pelo poder, para combater os guerreiristas, os opressores racistas e os exploradores e colocar a classe operária no poder, tanto nos Estados Unidos como em escala internacional.

Há resultado óbvio desde o princípio que há uma divisão entre as bases e a direção do sindicato no que toca a paralisação portuária. Como anotamos em nosso primeiro artigo sobre a ação (1º de maio), “A direção do ILWU poderia amedrontar-se, posto que esta proposta foi aprovada com o apoio majoritário dos delegados apesar de seus intentos de impedí-la – ou ao haver falado em seu intento, diluí-la ou limitá-la em seus alcances” (ver suplemento especial de El Internacionalista, 1º de maio). Explicamos então que os burocratas reduziram a paralisação de 24 a oito horas. Também advertimos que a direção do ILWU tentaria distorcer a ação com retórica patriótica, ainda quando não havia uma só palavra social patriota na resolução aprovada pela assembléia dos estivadores e ninguém dos que falaram na dita assembléia falou de apoiar as tropas. Assinalamos também como a esquerda oportunista, durante anos, tem-se recusada a lutar por greves operárias contra a guerra, dizendo que se trata de uma quimera ultraesquerdista [ver nosso artigo “Porque lutamos por greves operárias contra a guerra (e os oportunistas não)”]. Agora que houve uma greve operária contra a guerra –e não graças a eles– estes impostores se oporão a ampliar e aprofundar estas ações operárias rumo a luta pela revolução operária.

O indispensável partido revolucionário

O êxito da greve contra a guerra dos Estados Unidos se deve principalmente ao empenho dos setores mais combativos do ILWU em manterem-se firmes. Se recusaram a renderem-se ante as vacilações de sua direção diante das ameaças dos patrões da PMA. O sentimento contra a guerra da grande maioria das bases do sindicato manteve em cheque os burocratas, de modo que no lugar de cancelar a ação, como as cúpulas do sindicato claramente queriam fazer, estas tentaram evadir as ameaças da ação legal ao apresentar formalmente a greve como um assunto da “consciência” individual. Porém isto não confundiu em nada. Em várias entrevistas, o porta-voz dos patrões se queixa: “Estamos muito decepcionados com a direção do sindicato, pois esta não cumpriu com sua parte no contrato.” “É ainda mais preocupante para nós porque designa algo muito mais sinistro”. “Se trata de um protesto voluntário contra a guerra ou de uma greve encaminhada a incidir sobre as negociações contratuais? Não o sabemos… Estamos preocupados. Pensamos que estes velhos truques era coisa do passado.” A verdade é que se tratou de uma ação operária organizada em todo aspecto, na qual o sindicato em seu conjunto se manteve firme. Esta é a razão de seu êxito e de que sua mensagem tenha sido tão potente: a favor da ação operária para deter a guerra.

Letreiro do principal cine da cidade de Oakland, Califórnia: “Nós saudamos aos estivadores pela greve do 1° de maio em protesto contra a ocupação  criminosa no Iraque”.

O Internationalist Group contribuiu de maneira significativa para o êxito desta, a primeira greve de trabalhadores estadunidenses contra uma guerra imperialista estadunidense, ao fazer propaganda sistemática e insistente a favor de tais ações classistas ao longo da última década; ao intervir diretamente entre trabalhadores portuários da Área da Baía de São Francisco a favor de uma ação industrial contra a guerra (lutando para que os trabalhadores se recusem a transportar material bélico, particularmente durante o locaute patronal da PMA em 2002, lutando por greves operárias contra a guerra em uma confe-rência sindical em São Francisco em dezembro de 2002 e contribuindo com a organização da Conferência Sindical para Parar a Guerra convocada pela seção 10 em outubro do ano passado e ao alentar passos práticos para lograr este objetivo, para o qual foi preciso vários anos de preparação. Com a iniciativa do IG, nossos chamados gerais e nossas sugestões particulares, intenciona-mos mobilizar o poder da classe operária organizada, que é a única que pode converter este programa de luta de classes em uma realidade. E finalmente, no Primeiro de Maio de 2008, os trabalhadores do ILWU o fizeram: deram o primeiro passo até uma ofensiva operária para deter de uma vez a guerra e ocupação colonial do Iraque e Afeganistão. Ao fazê-lo, também assestaram um golpe contra a ofensiva contra os direitos democráticos e a guerra dos patrões contra os imigrantes, as minorias raciais oprimidas e a população trabalhadora deste país.

Agora é indispensável ir mais além deste importante começo e generalizar a luta por ações operárias para derrotar a guerra imperialista no exterior e também na frente interna. Para isto falta construir uma oposição classista no seio dos sindicatos e das organizações de massas da classe operária (incluídos os trabalhadores imigrantes não sindicalizados) para jogar fora os falsos dirigentes pró capitalistas que tem vendido conquista operária uma atrás da outra. Estas direções vendidas são incapazes de enfrentar a ofensiva capitalista porque sustentam o sistema capitalista, especialmente mediante seu apoio ao Partido Democrata (e inclusive, em alguns casos, ao Republicano). Hoje, com sua política de conciliação e colaboração de classes, estes “estadistas sindicais” são responsáveis pela implacável destruição do próprio movimento sindical. Entretanto, os “líderes comunitários” atam os imigrantes a seus exploradores mediante “organizações não governamentais” (ONGs) financiadas pelo governo. Tais dirigentes não poderiam jamais reviver o movimento operário nem conseguir plenos direitos democráticos para os imigrantes.

Contingente do Internationalist Group e dos Clubs Internacionalistas da Universidade da Cidade de Nova Iorque (CUNY) na marcha do 1° de maio.  “Estudiantes da CUNY apoim a greve dos portuários contra a guerra! Cartaz de fondo diz: “Partido Democrata lança guerras, fura greves, inimigo de todos os trabalhadores. Forjemos um partido operário revolucionário!”
(Foto: The Internationalist)

Sobretudo, como enfatizaram Karl Marx e Friedrich Engels no Manifesto Comunista, “toda luta de classes é uma luta política”. Engels escreveu em sua introdução de 1883 ao Manifesto que a idéia essencial de Marx é que na história das lutas de classe, “se chega a fase presente, em que a classe explorada e oprimida –o proletariado– não pode já emancipar-se da classe que a explora e oprime – a burguesia– sem emancipar para sempre a sociedade inteira da opressão, a exploração e as lutas de classes”. Assim pois, para ganhar a batalha contra os exploradores, a classe operária deve romper com o estreito sindicalismo e converter-se na defensora de todos os oprimidos. Deve dirigir a luta contra a guerra imperialista. Deve lutar por plenos direitos de cidadania para todos os imigrantes e mobilizar seu poder para deter as prisões maciças e deportações. Um movimento operário com consciência de classe deve lutar pela liberação dos negros e opor-se a todo e qualquer caso de brutalidade policial; deve estar pela libertação da mulher da dupla e as vezes até tripla opressão que sofre.

Levar a cabo estas tarefas exige uma verdadeira revolução nas consciências dos operários, que unicamente se pode lograr mediante a intervenção de um partido da vanguarda proletária que, como Lenin definiu suas tarefas, atue como “tribuno do povo” e não como um secretario sindical. Queremos construir o núcleo de um partido operário revolucionário mediante a propaganda, mediante a educação de seus futuros quadros e mediante a intervenção ativa na luta de classes. Esta luta é longe de ser simples e já tem tido muitos reveses, desde a sangrenta derrota da Comuna de Paris, passando pela vitória de Stalin contra Trotsky e do programa de Lenin da revolução socialista internacional, até a contra-revolução que destruiu a União Soviética estalinizada e aos estados operários burocraticamente deformados da Europa do Leste. No entanto, a luta de classe não se interrompe e depois de cada um destes reveses a classe operária deve fazer um balanço, analisar seus erros e rearmar-se politicamente. Quando temos êxito, como no caso desta primeira greve operária contra a guerra na história dos Estados Unidos, devemos ao mesmo tempo assinalar o caráter limitado e temporal de semelhantes vitórias parciais e prepararmos para as novas batalhas que se avizinham.

Hoje um sentimento “anti-partido” está na moda entre os esquerdistas pequeno-burgueses. No entanto, a paralisação contra a guerra dos trabalhadores portuários da Costa Oeste não caiu do céu. A combatividade das bases estava presente, porém ao longo de vários anos tem sido bloqueada pelos burocratas sindicais, “os lugar-tenentes dos capitalistas no seio do movimento operário”, como os chamou Daniel De Leon. Houveram os que lutaram por greves operárias contra a guerra, entretanto, outros não. Não somente os oportunistas pseudosocialistas, mas também muitos sindicalistas e anarquistas desdenharam os primeiros informes sobre o fechamento dos portos. Como escreveu Trotsky em seu livro Lições de Outubro (1924), resumindo a experiência da Revolução Russa de 1917 e o fracasso dos intentos revolucionários ocorridos na Alemanha desde 1918 até 1923: “Não pode triunfar a revolução proletária sem o partido, fora do partido ou com um sucedâneo do partido. Tal foi o principal ensinamento dos dez últimos anos”. Esta lição não tem perdido nada de sua vigência hoje em dia e em consonância com ela é que a Liga pela IV Internacional busca reforjar o partido mundial da revolução socialista.  n

           
Broches do Internationalist Group: “Greves operárias contra a guerra!” “Plenos direitos de cidadania para todos os imigrantes!” “Defender o Iraque! Derrotar o imperialismo estadunidense!”

O ILWU lança greve pela paz
Por Mumia Abu-Jamal

Não deve surpreender a ninguém  que o poderoso ILWU (International Longshore and Warehouse Union – sindicato de estivadores e armazenistas na Costa Oeste de EUA) tome a dianteira com esta paralisação portuária de oito horas a favor da paz. A orgulhosa e ilustre história do ILWU tem sido de apoio aos movimentos das pessoas pela vida, a liberdade e a solidariedade operária e também pelos direitos dos imigrantes em todo o mundo.

Os trabalhadores portuários fazem recordar as comovedoras palavras de Eugene Debs [dirigente socialista norte-americano, encarcerado por sua oposição à I Guerra Mundial], que disse há quase um século: “É a classe dominante  a que declara a guerra, mas é a classe subjugada a que trava as batalhas”. Por dizer isto e por estar contra a guerra, Eugene Debs foi preso. Que hoje em dia o ILWU esteja fazendo eco de suas palavras da uma mostra de seu poder e verdade 100 anos depois.

Prova também que pouco se tem avançado entre o início do século XX e o começo do século XXI, pois a guerra segue sendo uma ferramenta do poder imperial para enriquecer as grandes empresas e o domínio global. Quem poderia negar que esta é uma guerra pelo petróleo? Quem poderia negar que esta é uma ocupação ilegal e que importa muito mais o que está por debaixo da terra do que os milhões de seres que vivem aterrorizados em sua superfície?

Pode ser que no Iraque não tenha sido muito divertido antes da invasão e a ocupação; o que é seguro, é que agora é um inferno. Agora, o Congresso norte-americano, igual a Nero ante Roma em chamas, faz pouco mais que mexer os dedos. É a força do trabalho que faz que as engrenagens funcionem e esta poderosa mostra da paralisação do trabalho no Primerio de Maio, a favor da paz e pelo fim da ocupação no Iraque, é a solidariedade operária feita realidade.

Ao ILWU digo, bem feito! Pelo poder operário, a paz e a luta contra o imperialismo, lhes agradeço. Ona Move! Viva John África! Do corredor da morte, este é Mumia Abu-Jamal.


E-mail: internationalistgroup@msn.com

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