Nº 1,  julho-setembro de 1996
 

Princípios trotskistas

A seguinte matéria se publicou no primeiro número de Vanguarda Operária (julho-setembro de 1996) com o título "Princípios básicos". Dois anos depois, a LQB foi uma das seções fundadoras de nossa Liga pela Quarta Internacional.

Introdução
(julho de 1996)

Reproduzimos abaixo a "Declaração de Relações Fraternais" entre a Luta Metalúrgica (agora Liga Quarta-Internacionalista do Brasil, LQB) e a Liga Comunista Internacional (Quarta-Internacionalista), feita em setembro de 1994 e devidamente aprovada por ambas organizações. As posições políticas contidas nesta Declaração têm importância fundamental hoje para a luta pela revolução permanente no Brasil e internacionalmente. Isto é o caso, particularmente pela chamada da Declaração por oposição proletária a todas as frentes populares de colaboração de classes; sua reafirmação da defesa militar incondicional dos estados operários burocraticamente deformados contra o imperialismo e a contra-revolução, junto com a luta pela revolução política operária para tirar as burocracias estalinistas; e a insistência no papel do partido operário revolucionário como "tribuno do povo", dirigindo a luta contra todo tipo de opressão social e o ênfase na importância estratégica, para a revolução no Brasil, da luta contra a opressão racista do negro e a subjugação da mulher. 

A Declaração é uma reafirmação de princípios básicos do programa da revolução socialista internacional levantado como bandeira pela Internacional Comunista (Comintern) sob a liderança de Lênin e Trotsky, antes de que o conteúdo revolucionário da Comintern fosse destruída pelo dogma antiinternacionalista de Stalin do "socialismo em um só país". Assim como no programa da Quarta Internacional de León Trotsky, antes da sua destruição pelo revisionismo pablista, que atacou a própria base do trotskismo: a luta para construir um partido de vanguarda proletário, independente e oposto às direções traidoras, para resolver a crise histórica da direção revolucionária. Portanto não é surpreendente que tanto este documento como a LQB têm sido alvo dos ataques furibundos das correntes que falsamente se chamam "trotskistas", só para dar-se uma cobertura de "esquerda" para sua verdadeira política de colaboração de classes. Estes ataques vêm especialmente da Causa Operária (CO), grupo centrista que finge opor-se à frente popular ao mesmo tempo que vota no Lula, candidato da Frente Brasil Popular; e também da racha ultra-oportunista da CO, a "Liga Bolchevique Internacionalista". Durante os últimos dois anos, temos buscado, junto com a Liga Comunista Internacional (LCI), levar para adiante os princípios contidos neste documento, produzindo-se a decisão da Luta Metalúrgica de formar a Liga Quarta-Internacionalista do Brasil e o lançamento deste jornal, VANGUARDA OPERÁRIA, como órgão do grupo trotskista de propaganda lutador. 

No meio de junho de 1996, a liderança da LCI nos informou que tinha rompido as relações fraternais com a LQB. Logo depois, publicou um artigo extenso, cheio de falsidades, que repudia a Declaração mesma. Isto ocorre em meio a luta fundamental, empreendida pela direção eleita do sindicato dos trabalhadores municipais de Volta Redonda (SFPMVR), pela separação dos guardas municipais do sindicato, porque policiais, de nenhum tipo, não são parte do movimento proletário; eles são o braço armado da burguesia. A LQB apoia plenamente este esforço crucial no SFPMVR, como parte da luta pela independência política do movimento operário contro o estado burguês; por isto a LQB é alvo de ataques raivosos na imprensa burguesa e alvo também das ameaças e ataques da polícia e dos agentes políticos da mesma. Esta luta pela "independência total e incondicional dos sindicatos em relação ao estado burguês" (nas palavras que Trotsky enfatizou nos seus últimos escritos) leva na prática princípios contidos na Declaração que reproduzimos aqui e foi alentada originalmente pela LCI, que tem condenado corretamente os grupos pseudotrotskistas que apoiam a presença de policiais nos sindicatos. 

Porém, após empreendida esta luta, frente a estes ataques, a LCI abandonou esta luta e rompeu as relações fraternais com a LQB, expulsando também alguns militantes dirigentes a LCI. Esta fuga deve ser condenada como golpe contra a luta pela trotskismo autêntico e contra o programa que a LCI diz defender. (...) 

A destruição contra-revolucionária da URSS e dos estados operários deformados do Leste Europeu foi uma derrota histórica para o proletariado mundial. Porém, no periódo posterior têm ocorrido muitas lutas de classe fortes, desde Brasil, México e África do Sul até as lutas operárias na Itália (1992, 94) e as greves de dezembro de 95 na França. Nos parece que tem existido uma tendência na LCI de tirar conlusões derrotistas da derrota na URSS e no Leste Europeu, e que esta tendência se expressou na fuga da luta sobre a questão dos guardas municipais e o rompimento das relações com a LQB. Para a liderança pós-expurgo da LCI, que escreve duma forma assustada e pedante, lembramos que a luta de classes está viva, também, no período pós-soviético; e como Karl Marx disse depois da derrota da Comuna de Paris: "Não é possivel exterminá-la, por maior que seja a carnificina. Para fazê-lo, os governos teriam que exterminar o despotismo do capital sobre o trabalho, base de sua própria existência parasitária" (A guerra civil na França, 1871). Como dissemos em uma carta-resposta à LCI depois de seu rompimento de relações conosco, "Todo marxista deve encarar a realidade da luta de classes que, como um tornado do tipo 'Twister', estilhaçará a redoma de vidro daqueles que tentam esconder-se dela". Isto obriga aos explorados e oprimidos tirar suas lições das derrotas, tarefa que pode ser realizada somente por um partido revolucionário. Seguimos adiante neste esforço. 

Como internacionalistas proletários, lutaremos contra as correntes mencheviques que, seguramente, tentarão aproveitar-se deste rompimento para fortalecer o ruim "nacional-trotskismo". Seguimos defendendo o programo colocado na Declaração de Relações Fraternais e lutamos para reforjar a Quarta Internacional, genuinamente trotskista, partido mundial da revolução socialista. 


A Declaração de Relações Fraternais

"A crise histórica da humanidade reduz-se à crise da direção revolucionária.... A crise de direção do proletariado, que se tornou a crise da civilização humana, somente pode ser resolvida pela Quarta Internacional." 
– León Trotsky, "O programa de transição" (1938)
O grupo Luta Metalúrgica de Volta Redonda (Brasil) e a Liga Comunista Internacional (Quarta-Internacionalista) assinam esta declaração de relações fraternais como parte da luta urgente por superar a crise de direção proletária mediante o reforjamento da Quarta Internacional como partido mundial democrático-centralista da revolução socialista. 

I.

"No momento atual, a questão das questões é a frente popular. Os centristas de esquerda procuram apresentar esta questão como uma manobra tática ou até técnica, para poder melhor vender sua mercadoria na sombra da frente popular. Na realidade, a frente popular é a questão principal da estratégia proletária desta época. Também oferece o melhor critério para distinguir entre o bolchevismo e o menchevismo." 
– León Trotsky, "Carta ao RSAP holandés" (julho de 1936; ênfase no original) 
Desde a luta de Marx e Engels pelo princípio básico da independência revolucionária do proletariado frente à burguesia, o marxismo genuíno tem lutado contra a colaboração de classes. O combate de Lênin e os bolcheviques contro o Governo Provisório de Kerensky (que Trotsky depois chamou o maior examplo histórico da frente popular), culminou no triunfo mais importante do proletariado mundial: a Revolução de Outubro de 1917. Se opondo à traição de stalinistas, social-democratas e centristas, os quarta-internacionalistas sob a direção de Trotsky lutaram encarniçadamente contra qualquer apoio às frentes populares, as quais na França e Espanha prepararam terríveis derrotas do proletariado, preparando assim o caminho à segunda Guerra Mundial imperialista. 

Em nossos dias a luta contra o frente-populismo traça uma linha divisória entre o marxismo revolucionário e toda variante de oportunismo. No Chile, a Unidade Popular de Allende atou o combativo proletariado às instituicões do estado burguês, preparando o desfecho sangrento do golpe militar de Pinochet em 1973. Já em 1970 com a eleição de Allende, quando todas as correntes pseudotrotskistas chamaram por uma ou outra forma de apoio à frente popular, a tendência espartaquista (hoje LCI) advertiu: 

"É o dever mais elementar dos marxistas revoucionários, opor-se irrreconciliavelmente à frente popular nas eleições e não ter absolumente nenhuma confiança nela quando está no poder. Qualquer 'apoio crítico' à coligação de Allende seria uma traição à classe, abrindo o caminho para uma derrota sangrenta dos trabalhadores quando a reação nacional, auxiliada pelo imperialismo internacional, está pronta." 
– [Spartacist (edição em inglês) n° 19, novembro-dezembro de 1970]
Frente à eleição da frente popular de Mitterrand em 1981 na França, uma vez mais os espartaquistas advertiram contra qualquer apoio a esta colaboração de classes, enquanto os pseudotrotskistas (desde Mandel e Moreno até Lambert e Altamira) a saudaram como um "triunfo" da classe operária. A política frente-populista conduziu a mais derrotas, desde Bolívia até El Salvador, Nicarágua e muitos outros países. 

Hoje em dia, na África do Sul, a frente popular nacionalista construida ao redor do Congresso Nacional Africano, dirigido por Nelson Mandela, ata os operário negros ao aparato estatal burguês, o qual mantinha o regime criminoso do apartheid. É o dever dos revolucionários, advertir urgentemente contra qualquer apoio político ou confiança no governo de "co-governo", o qual já está atacando os trabalhadores negros e mestiços. Notamos a importância para os operários da África do Sul da luta contra o frente-populismo do reformista Partido dos Trabalhadores brasileiro; e dos acontecimento na África do Sul para os operários e jovens radicalizados no Brasil. 

No Brasil a esquerda está impregnada com o nacionalismo e o reformismo frente-populista. No momento atual suas várias correntes se competem uma com outra para ver quem pode capitular melhor à Frente Brasil Popular (FBP), a coligação aberta do PT de Lula com políticos da burguesia. Esta frente faz todo o possível para desmobilizar os explorados e oprimidos neste país, o qual tem um proletariado altamente combativo e se encontra em um situação de profunda turbulência social. Os burocratas sindicais e seus assessores esquerdistas insistem que em vez de lutar, os trabalhadores devem "esperar" a eleição de Lula e não "atemorizar" seus aliados burgueses. Os estalinistas (PPS e PC do B), com sua doutrina de colaboração de classes, apoiaram os governos burgueses de Sarney, Collor e Itamar Franco e agora estão dentra da frente popular dirigida por Lula. Enquanto os mandelistas da Democracia Socialista e lambertistas de "O Trabalho" se deliciam em seu papel já tradicional de fiéis servidores de Lula e Cia., os morenistas do PSTU adotaram um postura hipocritamente "crítica", enquanto simultaneamente têm ingressado abertamente na FBP. 

À esquerda destas correntes se encontram os centristas de Causa Operária (CO). Os camaradas de Luta Metalúrgica foram recrutados a CO originalmente porque acreditavam que representava uma oposição revolucionária, trotskista, à frente popular. Porém já nas eleições de 1989, enquanto "criticou" a frente popular, CO votou pelo candidato dela, Lula. Desta forma sua "critica" não teve nenhuma conseqüência nos feitos, servindo somente como cortina de fumaça para seu voto a favor da colaboração de classes. 

Frente às eleições de 1994, CO tem dado uma volta depois de outra, tentando primeiro fazer uma "distinção entre apoiar Lula e fazer campanha por ele e eventualmente, chamar o voto no candidato do PT" (Circular Interna, 1° de abril), fingindo logo uma posição de "nenhum voto nos candidatos da Frente Brasil Popular" (jornal Causa Operária, 12 de junho), para acabar chamando por "votar em Lula e nos candidatos operários e camponeses" (Causa Operária, 1° do agosto). Desta forma CO reproduz o truque típico dos pseudotrotskistas, de argumentar que votar pelos "candidatos operários" da frente popular (neste caso incluindo seu candidato presidencial), é de alguma maneira "distinto" de votar pela frente popular como tal. 

Para estes pequeno-burgueses, que vendem sua mercadoria na sombra da frente popular, as frases "esquerdistas" não devem ser tomadas à sério: só servem para embelezar seu seguidismo a seus amos reformistas! Sua linha não tem nada que ver com a de Trotsky, que caracterizou o apoio do centrista POUM de Andrés Nin à frente popular espanhola como uma traição e sublinhou frente ao governo dela: "Tem que mobilizar aberta e audazmente as masses contra o governo da Frente Popular" ("É possível a vitória?", abril de 1937). 

Notamos que tradicialmente esta corrente "nacional-trotskista", tem justificado suas traições com o etapismo menchevique e referências à "frente única anti-imperialista", fórmula usada par Guillermo Lora na Bolívia (anteriormente aliado do Partido Obrero argentino de Jorge Altamira e CO no Brasil), para justificar sua capitulação vergonhosa a toda uma série de frentes populares. 

Contra este menchevismo, em um documento de oposição à linha de CO (abril de 1994), os camaradas de Volta Redonda (Luta Metalúrgica) caracterizaram a FBP como "uma frente de colaboração de classes", uma frente popular. Exigiram "que Causa Operária rompa com o PT e a frente popular em todas suas variantes.... O dever elementar de todos os Marxistas revolucionários é combater irreconciliavelemente a Frente Popular nas eleições, e não ter absolutamente nenhuma confiança nela." Esta clara denúncia foi suprimida pela direção de CO, junto com toda a última parte do documento, na Circular Interna de CO. Um documento posterior (julho de 1994) escrito pelos camaradas contra a capitulação de CO terminou com a clara palavra-de-ordem: "Por um partido operário revolucionário – Nenhum voto para [a] frente popular e Lula." A Liga Comunista Internacional colocou a mesma posição de intransigente oposição proletária à frente popular. 

II.

A situação mundial de hoje, tem sido profundamente afetada pela destruição contra-revolucionária da União Soviética e os estados operários deformados do Leste Europeu. Longe de representar um "triunfo" o mero "episódio" como alegam os pseudotrotskistas (incluindo CO, que virtualmente segregou seus militantes de toda discussão da Questão Russa), a restauração do capitalismo na URSS – resultante do cerco e enormo pressão do imperialismo e preparada por décadas de traições stalinistas – representou uma grande derrota para os operários do mundo. Suas repercussões sobre as vítimas semicoloniais do imperialismo estão muito claras desde Iraque até Haiti, com as crescentes aventuras bélicas do imperialismo ianque, que agora ameaça estrangular o estado operário deformado de Cuba (minado desde dentro pela burocracia de Castro). 

Na atual "nova desordem mundial", crescem as rivalidades interimperialistas, guerras interétnicas fratricidas e ataques fascistas contra imigrantes e trabalhadores não-brancos na Europa, as investidas contra os direitos da mulher. Ao mesmo tempo, a turbulência mundial – simbolizada pela rebelião de camponeses índios no sul do México, a vitoriosa greve de Air France, mobilizações juvenis contra os fascistas na Europa e muitos outros acontecimentos – abre oportunidades para a intervenção revolucionária do proletariado. É mais urgente que nunca forjar o partido internacional da vanguarda leninista. 

Trotsky, fundador do Exército Vermelho, nos ensinou que os que não defendem as conquistas que já foram ganhas jamais poderão ganhar novas conquistas. Assinalou o caráter dual da burocracia (stalinista), uma estreita casta nacionalista que se sentava em cima das conquistas de Outubro: às vezes se via obrigada a defender, de sua pópria maneira parcial e contraditória, estas conquistas, ao mesmo tempo que socava estas ao trair a revolução mundial e pisotear a democracia proletária. 

Trotsky e James P. Cannon, fundador do trotskismo norte-americano, compararam a política revolucionária frente à URSS à situação de um sindicato burocratizado. Os operários conscientes defendem o sindicato contra o governo capitalista e os patrões, ao mesmo tempo que lutam por uma direção revolucionária para expulsar os burocratas traidores. Da mesma forma, o proletariado mundial devia dar defesa militar incondicional à URSS, enquanto lutava pela revolução política proletária contra a burocracia stalinista, imprescindível para evitar a restauração capitalista. Durante todo o periódo da Oposição de Esquerda e a luta pela Quarta Internacional, enfatizou que "Defender a União Soviética dos ataques dos inimigos capitalistas, além das circunstâncias e causas imediatas do conflito, é obrigação elementar de toda organização operária honesta" ("A guerra e a Quarta Internacional", junho de 1934). 

A direção de CO jamais falou de textos clássicos de Trotsky como Em defesa do marxismo (escrito contra a oposição pequeno-burguesa de Shachtman que se renegou da defesa da URSS), porque tem tido uma posição neo-shachtmanista frente a todos os conflitos entre os inimigos capitalistas e a URSS. Depois que os altamiristas saudaram a "revolução" islâmica do verdugo feudalista Khomeini no Irã, se opuseram à intervenção soviética no Afeganistão contra os "guerreiros santos" que lutavam para derrocar o regime nacionalista de esquerda pelo "crime" de decretar a educação para as mulheres e uma reforma agrária. [Veja Nota 1 ao final do texto.] A CIA apetrechou os fanáticos anticomunistas com quantitades enormes de armas e dinheiro, para que matassem soldados soviéticos nesta frente de batalha da Segunda Guerra Fria. No Brasil os ultra-reacionários da Tradição, Família e Propriedade marcharam com o grito de "Fora russos do Afeganistão!" e os pseudotrotskistas tinham a mesma posição! A tendência espartaquista, seguindo os princípios da Quarta Internacional de Trotsky, defendeu a URSS e as mulheres e os oprimidos afegãs, dizendo "Vivo o Exército Vermelho no Afeganistão!" 

Quando no Polônia Solidarnosc se consolidou como movimento clerical-nacionalista pela restauração capitalista, sob a égide do Vaticano e Reagan, o PT brasileiro elogiou o "exemplo" de Walesa: Lula em particular buscou identificar-se com este títere do imperialismo. A questão do Solidarnosc foi uma prova de fogo para toda corrente que se reclamava do trotskismo. Os pseudotrotskistas gritaram sua "solidariedade com Solidariedade". Enquanto Moreno chamou por "Todo o poder a Solidariedade", Altamira chamou pela "tomada do poder pelo Solidariedade". 

Os espartaquistas, em contraste, disseram: "Alto à contra-revolução de Solidariedade!" Como assinaram os camaradas de Luta Metalúrgica em seu documento de julho [de 1994], "o operário" Walesa a quem seguiam os falsos trotskistas "foi o melhor e principal instrumento do imperialismo [e] do Vaticano para a contra-revolução". Conforme às advertências da LCI, o triunfo deste movimento anticomunista tem trazido sofrimentos terríveis para os trabalhadores polacos. 

A direção de CO teve o descaramento de atacar os camaradas de Luta Metalúrgica por ousarem dizer a verdade que é evidente a milhões de operários conscientes: que a destruição de estado operário deformado da Alemanha Oriental, mediante sua anexação pelo imperialismo alemão, foi uma derrota para os trabalhadores do mundo. Enquanto que a LCI fez tudo o que pôde para lutar contra a reunificação capitalista e por uma Alemanha vermelha de conselhos operários como parte de uma Europa socialista, Altamira asseverou que a "'unificação' falsa da Alemanha deverá abrir, mais cedo que tarde, uma grande mobilização de massas e uma situação revolucionária, que não eximirá nenhum país da Europa" (Prensa Obrera, 3 de julho de 1990). Longe de produzir uma situação "revolucinária", a reunificação alemã resultou em um auge de terror racista, o desemprego para milhões com o fechamento de fábricas, e a destruição das conquistas dos trabalhadores, com resultados especialmente brutais para as mulheres trabalhadoras. 

Enquanto que os espartaquistas organizaram um protesta em Nova Iorque contra a retirada por Gorbachov e Yeltsin da brigada soviética (em Cuba) em 1991, que deu luz verde ao imperialismo para uma possível invasão, longe de protestar, o jornal de CO (12/18 de outubro de 1991) proclamou que não importava porque "a presença das tropas soviéticas em Cuba não tem nenhuma relação com a defesa da ilha...." Hoje em dia CO publica uma resolução (17 de julho) de seu congresso nacional, sobre a ameaça de Clinton de invadir o Haiti, na qual nem sequer menciona o urgente perigo contra a Revolução Cubana. 

Era o cúmulo quando Yeltsin se aproveitou do fracassado golpe do "Bando dos Oito" em agosto de 1991, para lançar uma campanha para destruir completamente o que restava das conquistas de Outubro e o estado soviético. Na URSS a LCI distribui milhares de panfletos com o chamado urgente "Operários soviéticos: Derrotar a contra-revolução de Yeltsin e Bush!" Enquanto os morenistas gritavam vivas à "nova revolução russa", a linha absurda de Altamira era que o imperialismo norte-americano apoiava não o seu homem Yeltsin mas sim o "Bando dos Oito" – ou seja, que o fundamental nesse momento para os operários soviéticos era lutar contra estes antigos stalinistas e não contra Yeltsin, o homem de Bush e ponta de lança da contra-revolução capitalista aberta. CO repetiu a propaganda falsa de que uma "mobilização de massas" derrotou o fracassado golpe do Bando dos Oito. 

É óbvio porque Altamira e CO não querem que seus militantes se dêem conta da linha de Trotsky sobre a Questão Russa! Não é acidente que uma corrente que capitula à colaboração com sua "própria" burguesia haja capitulado à campanha imperialista contra as conquistas da Revolução de Outubro, campanha que culminou na destruição da URSS. 

III.

A Internacional Comunista de Lênin e Trotsky proclamou que "A questão dos negros se tem convertido numa parte íntegra da revolução mundial". O Brasil tem a maior população negra do mundo depois da Nigéria, e como parte da classe operária brasileira os trabalhadores negros e mulatos têm uma enorme força potencial. A luta contra a opressão dos negros no Brasil é uma questão estratégica da revolução proletária. Como notou Cannon em seu ensaio sobre a Revolução Russa e os negros norte-americanos (1961), foram Lênin e os bolcheviques quem insistiram em que a oppressão dos negros é uma questão especial, que requer de atenção e trabalho especial do partido revolucionário. 

Como disse Lênin em Que fazer?, o partido de vanguarda deve ser o "tribuno do povo", lutando para mobilizar a força da classe operária contra todo tipo de opressão. A urgência disto se vê no Brasil, onde esquadrões da morte assassinam constantemente "meninos de rua" negros. Nas siderúrgicas, os operários negros estão condenados à morte por leucopenia. [Veja Nota 2 ao final do texto.] Mas a atitude da pseudo-esquerda brasileira, que segue o PT social-democrata e a burocracia da CUT, é a estreita posição "trade-unionista" e economicista contra o qual lutaram os bolcheviques de Lênin. 

Isto se vê da forma mais escandalosa no caso de Causa Operária, que como têm notado os camaradas de Luta Metalúrgica, tem sido deliberadamente cega à opressão dos negros. CO nem sequer abordou a questão nas [3.500] linhas da coleção de seus documentos fundamentais desde 1979 a 1988 (Bases Programáticas). Esta coleção foi publicada justamente quando dezenas de milhares de negros marcharam pelas ruas no centenário da abolição da escravatura, gritando consignas contra o brutal racismo do Brasil atual e tentando derrubar a estátua do massacrador racista Caxias! 

Num importante esforço por enfrentar esta questão estratégica, Luta Metalúrgica escreveu um documento em agosto de 1993 para o seminário "O papel da CUT no combate contra o racismo". Neste documento, que representou um periódo transicional no desenvolvimento do grupo e foi marcado por algumas debilidades importantes (como a consigna de frações negras nos sindicatos), os camaradas chamaram por milícias operárias-camponesas para a autodefesa na luta contra o terror racista, denunciaram a esterilização forçada das mulheres negras e criticaram o silêncio da pseudo-esquerda sobre a opressão dos negros, que ia junto com o fato de que o grosso da "esquerda" votou por um salário mínimo de fome (menos de 100 dólares mensais) que condena milhões de negros à superexploração. No período recente, em um chamativo esforço internacionalista, os camaradas traduziram o documento "Negro e vermelho – Caminho classista à libertação dos negros" (1967), no qual a Spartacist League dos Estados Unidos elaborou o programa do integracionismo racial revolucionário. 

Como tribuno dos oprimidos, é imprescindível que o partido leninista tenha que abandeirar a luta contra a opressão da mulher, arraigada na instituição da família burguesa, uma questão de suma importância no Brasil como parte do programo da revolução permanente. A defesa dos direitos dos índios e homossexuais é um elemento importante na luta contra os preconceitos burgueses que envenenam a consciência dos trabalhadores e contra a pseudo-esquerda nacionalista que reproduz os valores sociais de "sua" burguesia. 

O que disse Trotsky em 1939 sobre os negros nos EUA também se aplica hoje em dia: 

"Nós devemos dizer aos elementos conscientes dos negros que eles estão convocados pelo desenvolvimento histórico a converter-se em uma vanguarda da classe operária.... Se ocorre que...somos incapazes de encontrar o caminho até este estrato, então não valemos nada. A revolução permanente e todo o mais somente seria uma mentira." 
– León Trotsky, "Planos para a organizacao negra" (abril de 1939)
A questão dos negros no Brasil, tanto como nos Estado Unidos, não é uma questão nacional, e as fantasias do nacionalismo negro sobre a "autodeterminação" são um obstáculo à luta contra a opressão. O único caminho da libertação dos negros é o da revolução socialista, levada a cabo pelo proletariado sob a direção do partido leninista multiracial. Isto significa que é imprescindível forjar quadros negros do partido trotskista internacionalista. Inspirados pelo heroísmo de lutadores como Zumbi, João Cândido, Toussaint L'Ouverture, Frederick Douglass, John Brown e Sojourner Truth, o começo do estudo conjunto da questão negra é um importante elemento destas relações fraternais. 

IV.

Os camaradas de Luta Metalúrgica terminaram seu documento de abril contra a frente popular citando o que escreveu Trotsky sobre Espanha nos anos 30: "Para levar a cabo eficazmente todas estas tarefas são necessárias três condições: o partido, o partido e uma vez mais o partido." Chamando por "um reagrupamento revolucionário que tome a forma da construção de um partido trotskista com uma firme base programática marxista", eles enfatizaram: "A chave para um reagrupamento revolucionário bem sucedido é portanto uma profunda luta pelo internacionalismo e pelo programa de transição." 

Imprescindível neste esforço é a luta para forjar quadros de um núcleo leninista. O partido se constrói, nas palavras de Lênin, "de cima para baixo", sobre a base do programa quarta-internacionalista. Em seu início – em contraste com as vazias pretensões "de massas" da pseudo-esquerda – tal núcleo tem que ser um grupo de propaganda lutador. No Brasil é prioritário o esforço para publicar uma revista trotskista, proporcional ao tamanho e trabalho real do grupo, para propagar o programa revolucionário. Com a autoridade ganha em anos de encarniçadas lutas operárias, os companheiros de Luta Metalúrgica enfrentam a necessidade de polemizar contra os que sujam o nome do trotskismo – em primeiro lugar os centristas de Causa Operária; ver a possibilidade de reagrupamentos mediante cisões e fusões; e incorporar jovens, para que uma nova geração de revolucionários possa entrar na luta contra a barbárie capitalista. Seguramente o esforço para construir um grupo de propaganda implicará decisões difíceis quanto às prioridades, que terão que ser resolvidas mediante a discussão coletiva. 

Os valores podres dos grupos social-democratizantes como o PSTU e CO, se mostram não somente em questões como seu apoio a "greves" da polícia (os profissionais da repressão antioperária e racista) e chamados por uma polícia mais "popular". Se mostram também no aberto desprezo dos dirigentes de CO contra os operários revolucionários de Luta Metalúrgica, a quem difamam como "ignorantes" e atrasados. Declaramos conjuntamente uma luta sem piedade para desmascarar politicamente estes pequenos-burgueses que seguem a reboque da frente popular, e não perdem a oportunidade de fechar a boca frente à opressão dos negros e das mulheres. 

Para nós, o internacionalismo não é um belo sentimento para resoluções e discursos dominicais. É a luta para construir um partido mundial baseado no centralismo democrático revolucionário, muito contrário às federações nacionais de um sem-número de oportunistas nacionalistas. 

A trajetória de luta de Luta Metalúrgica contra a frente popular e para encontrar um programa proletário contra a opressão dos negros, tem um profundo paralelismo com a luta da tendência espartaquista desde sua fundação e dá uma sólida base para ir adiante conjuntamente. Sublinhamos a necessidade de realizar trabalho conjunto, com plena consciência das dificuldades implicadas pela distância geográfica e outros obstáculos – dificuldades cuja superação requererá esforços conscientes e mútuos. Assinalamos como tarefa urgente o estudo de português por camaradas da LCI e de espanhol e inglês por camaradas de Luta Metalúrgica. 

Nossa perspetiva é que estas relações fraternais sejam um passo até a fusão de nossas organizações, unificando nossos esforços na luta pelo comunismo em todo o planeta. A realização de semelhante fusão seria uma extensão importante da LCI. Lutamos para reforjar a Quarta Intemacional sobre a base do comunismo de Lênin e Trotsky e as regras assinaladas no "Programa de Transição": 

"Olhar face a face a realidade; não procurar a linha de menor resistência; chamar as coisas pelo seu nome; dizer a verdade às massas, por mais amarga que seja; não temer os obstáculos, ser fiel nas pequenas coisas como nas grandes, fundar o seu programa na lógica da luta de classes; ser audaz quando chegar a hora de ação: tais são as regras da Quarta Internacional." 
20 de setembro de 1994 

– Aprovada por Luta Metalúrgica, 22 de setembro de 1994 

– Aprovada pelo Secretariado Internacional, Liga Comunista Intenacional (Quarta-Internacionalista), 26 de setembro de 1994. 
 

Notas: 

N° 1:  Alguns apologistas de Altamira agora fingem que ele "apoiou" a intervenção soviética, informando-nos de uma resolução ("Os trotskistas frente à invasão do Afeganistão", outono de 1980) da efêmera Tendência Quarta-Intemacionalista (TQI) de Altamira e Lora. De forma centrista, esta resolução acende uma vela para Deus e outra para o Diabo, dizendo que "não condenamos a invasão, apesar de que ataca o princípio da autodeterminação". Outra vez fazendo reverência à direita, a resolução da TQI gritou que a União Soviética usava as "medidas militares mais brutais, que levam de fato a uma ocupação do país pelo Exército Vermelho...."

O Boletim lnformativo (N° 5, fevereiro de 1982) da "Célula Central na Europa do POR" boliviano de Lora, foi ainda mais longe em ecoar a histeria anti-soviética reaganista, condenando "a política expansionista e de dominação dos burocratas do Kremlin", e saudando "a resistência" dos "guerrilheiros" que supostamente lutavam pela "soberania nacional" do Afeganistão, etc.

Nove anos depois da resolução da TQI, o Partido Obrero de Altamira declarou que "o alcance intemacional do retiro soviético é, portanto, tão contra-revolucionário como foi em seu momento a ocupação do Afeganistão" (Prensa Obrera, 23 de fevereiro de 1989). 

N° 2:  Leucopenia – enfermidade causada pela diminuição dos glóbulos brancos no sangue, quando as pessoas inalam o gas benzeno (subproduto do carvão coque utilizado nas siderúrgicas). A Companhia Siderúrgica Nacional de Volta Redonda (RJ) sustenta que esta é uma enfermidade "genética dos negros".
 


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